Mais um poema de Kabir

Imagem tradicional de Kabir, tecelão e mestre.

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A escuridão da noite desce, densa e profunda,

Mas sobre a cabeça a luz do amor se derrama.

Abre a janela e te perde na imensidão estrelada.

Bebe do mel que o lótus de teu coração emana.

*

Percebe quebrarem-se em ti as ondas do mar.

Escuta o zumbido dos búzios em teu interior.

Recolhe-te. Aquieta-te. Conserva-te no lugar.

Tu és o vaso no qual viceja, eterno, o Senhor.

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Comentário

Este é o 23º dos 100 poemas de Kabir, traduzidos para o inglês por Rabindranath Tagore, que eu recriei em português (Attar Editorial).

As várias imagens nele evocadas talvez se tornem mais compreensíveis a partir da perspectiva do ioga. O “lótus do coração”, que emana o doce mel, seria o chakra anahata, localizado no centro do peito e considerado a sede daquela instância de nosso ente total que Sri Aurobindo chamou de “ser psíquico”. As “ondas do mar”, que se quebram no corpo, seriam os fluxos do prana ou energia sutil. O “zumbido dos búzios”, que cresce no interior, seria uma metáfora de Aum, o Som Primordial, primeira manifestação fenomênica do Divino.

Os dois últimos versos lembram imediatamente a famosa passagem do Salmo 46: “Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus”.